quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Presente

Tenho um urso de peluche castanho que vive no meu quarto e, às vezes, acompanha-me noutras andanças, espremido entre a bagagem necessária para voos longe de casa. Já não tenho idade para brincar com bonecos nem ele serve para brincadeiras. É tão somente o companheiro silencioso quando o barulho à volta me impede de pensar. Um monte de pêlos e ácaros que não reclama quando fica ensopado de lágrimas ou é atirado ao ar... porque vê-lo rodopiar aumenta a sensação dos dias felizes. É a cara conhecida nas noites solitárias de um quarto de hotel. O adorno que destoa da fachada. O segredo que é só meu. Quem me espera quando não há mais nada a esperar. Não há qualquer história fabulosa que explique a sua existência – a não ser o facto de ter chamado a atenção quando estava na prateleira de uma loja numa cidade distante - mas se ele tivesse o dom da palavra poderia contar quase todas as histórias da minha. Não falo com ele e a sua grande vantagem, desconfio, é nunca me perguntar nada. Certamente não compreende as curvas da vida mas, entre os de ‘carne e osso’, também são poucos os que julgam entendê-las. Hoje escrevo sobre ele porque descobri que, como diz a canção, não sou a única. Há por aí um grande urso branco intrometido em canções. O meu também sobreviveu às mudanças. De morada e de espírito. Vive conformado no seu fato fofo e rechonchudo, de onde despontam duas orelhas arredondadas. Sorte a dele. Eu sou inconformada por natureza e isso, às vezes, dói. Não sei porque me afeiçoei a ele, mas talvez seja porque está ali, presente. E só por isso ganhou direito a um nome: chama-se Rupert...

2 comentários:

Apostol disse...

O texto é lindo e talvez por isso, o meu humor corrosivo salta aos saltos - se isso é possível...
E, além de te perguntar, sobretudo reforçado pelos teus lados irlandeses, se por acaso és prima do Mr Bean, quando leio a cena das orelhas redondas do ursinho e a seguir leio que te dói, sou levado a perguntar se te puxaram as tuas orelhas....
Mas enfim, de verdade que é um texto lindo que me remete para uma história, uma das muitas escritas no 'Anexo' por Anne Frank: Blurry, o Explorador - o simpático ursinho que decide ir ver o mundo...

B. disse...

=D
Oh... na minha cama habita um cão de peluche... mas é demasiado grande para o espremer na mala... o k vai nas malas já vai tts vezes espremido!
De kk forma adorei o tu rupert, eu contento-m em tagarelar com a almofada! ;)
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B.